A Crise do Civismo Político no Brasil
Diferente de momentos de ruptura já vividos no país, a atual crise política se caracteriza pela corrosão do debate público e pela perda de confiança nas instituições.
Meses atrás, em uma entrevista do historiador Marco Antônio Villa com o ex-presidente Michel Temer, ouvi uma expressão que me marcou e inspira esta reflexão.
O Brasil atravessa hoje a maior crise desde a promulgação da Constituição de 1988. Não se trata apenas de economia ou de setores como saúde, segurança e educação. A crise é, sobretudo, política e institucional, corroendo o debate público e desafiando o funcionamento da democracia.
Na história recente, o país já enfrentou impasses de grandes proporções. Em 1964, a instabilidade política e o confronto ideológico levaram à ruptura institucional e a duas décadas de ditadura. Em 1992, a crise culminou no impeachment de Fernando Collor, mas naquele episódio prevaleceu a solução constitucional e a preservação das instituições. Em 2016, novo processo de impeachment novamente testou a resiliência do sistema político, mas ainda dentro das regras do jogo democrático.
O cenário atual é distinto. Mais do que disputas de governo, assistimos à banalização do debate público, tomado por ataques pessoais e termos pejorativos, amplificados pelas redes sociais. A política, em vez de discutir projetos de nação, se reduz a idolatrias e a agressões mútuas, muitas vezes desprovidas de conteúdo.
Outro fator preocupante é a relativização de garantias fundamentais. Processos sigilosos e restrições ao direito de defesa colocam em risco o que a Constituição consagrou. A consequência é o enfraquecimento do verdadeiro civismo político e a crescente desconfiança da sociedade em relação às instituições.
O perigo é claro: sem respeito à lei e às regras constitucionais, as próximas gerações pagarão caro pela radicalização que mina o equilíbrio entre os Poderes. Democracia exige pesos e contrapesos, fiscalização e debate baseado em propostas de gestão e caminhos para o desenvolvimento nacional.
Cabe aos atores políticos de direita, centro, esquerda ou mesmo aqueles que se mantêm em cima do muro resgatar o exemplo do civismo político e respeitar a soberania popular expressa pelo voto. Só assim será possível evitar que a crise atual seja lembrada no futuro como um novo marco de ruptura institucional
